domingo, 19 de dezembro de 2010

de 14/12 à 19/12 - Antarctica Classica: revendo velhos amigos

14/12 - Dia da Mudança

Acordei mais cedo do que de costume por causa da ansiedade de falar com minha filha. Que coisa ótima falar com ela. A tecnologia é fantástica ! Mas o trabalho me chamava.

(1) Café da manhã em pleno briefing de desembarque, (2) desembarque de passageiros na base Eduardo Frei, (3) visita a igreja ortodoxa na base russa de Bellingshausen e (4) translado dos passageiros até o prédio do Instituto Antártico Chileno INACH (Ezcudero), além é claro, de receber os novos passageiros que chegavam. Vida dura ?! nem tanto. Até que foi bem tranquilo.


Vista da proa do Ocean Nova durante minha passagem em direção a terra.

Mariano me deixou coordenado a operação de terra enquanto ele se preocupava com o avião que iria chegar com o grupo novo mais o desembarque de bagagem do navio. Primeiro, me organizei com Daniel, Samuel e Miguel para os nossos visitantes irem até a igreja ortodoxa. Depois, descemos até a base russa para carimbar passaportes.



Vista da Igreja Ortodoxa e eu, em um breve sorriso na frente da base russa.

Bem, por volta das 12hs chegou o voo finalmente, e uma hora depois conseguimos fazer a troca de passageiros pelo caminho entre Ezcudero e a pista. Uma montanha de malas, 4 botes na praia e passageiros misturados (franceses, americanos, espanhóis e dois brasileiros !), tudo isso para subir a bordo. Nem deu muito tempo de pensar. Vupt ! todos a bordo para o almoço, menos nós, os guias, que ficamos de distribuir todas as malas pelas respectivas cabines. Caramba ! que sufoco.

Quando tudo isso terminou, tivemos tempo apenas de comer algo leve pois haveria um desembarque logo em seguida. Ainda consegui uns 30 minutos para atualizar o facebook, mandar um beijo para a familia e escrever recados para alguns amigos mais próximos. Logo as 17 horas descemos em Ardley Island, uma pequena ilhota cheia de pinguins praticamente colada a base Frei. nem precisamos movimentar o barco. Mariano deixou sob minha guarda o controle de praia, e consegui me organizar muito bem com os passageiros e guias. (Adoro essa parte !).



Vista panoramica de Ardley Island.

As pinguineiras estavam forradas de pinguins com filhotes. Bom sinal ! mas não vi nenhuma skua. Interessante. Ano passado haviam várias skuas e muita neve na praia. Este ano, aparentemente mais quente, as skuas sumiram e há pouca neve por aqui. Vamos ver o que vamos encontrar ao sul da península. Por volta das 18h30 estávamos já todos a bordo, se preparando para o Briefing com os passageiros, com as instruções de Mariano para a travessia do estreito de Bransfield.



Foi um coquetel de boas vindas simples, uma janta boa com comida quente, e uma noite de sono merecido. Fui para a cama antes das 22h30 porque meu corpo pedia um sono restaurador. Estrranhamente não tenho sonhado muito. Será que é cansaço físico ?!

15/12 - Mikkelsen Harbour & Cierva Cove

Acordei as 03:50 da manhã com o sol entrando forte pela janela (isso mesmo !) e me enfiei mais fundo ainda debaixo das cobertas tentando cobrir a cara. Não sei como Samuel conseguia dormir pois o sol caia exatamente em cima da cama dele. Consegui cochilar um pouco até as 7hs quando soou o "despertar" do Mariano pelo sistema de som do navio. Eu precisava dormir.....depois do dia anterior eu estava cansadíssimo. Levantei da cama rapidamente, troquei de roupa e fui para o salão de jantar (Dinner Room) pois todos os dias temos briefing 10 minutos antes de abrirem as portas para os passageiros. A idéia era parar em um pequeno ponto abaixo da ilha Trinity, chamado Mikkelsen Harbour. Na ilha tem um refúgio argentino abandonado e meio destruido, e alguma coisa como 3.000 pinguins.

Vista Panoramica de Mikkelsen Harbour, Ilha Trinity.



Mapa da Ilha Trinity com a posição de Mikkelsen.

Foi um desembarque difícil. Embora o tempo estivesse maravilhoso, havia muita neve fofa no meio da ilha. Caminhar era um martírio e tinhamos que abrir uma trilha no meio da neve para os passageiros passarem, e sem perturbar os pinguins no vai-e-vem da pinguineira. Fiquei enxarcado de suor de tanto tirar neve do meio do caminho. Samuel e eu marcamos a trilha enquanto que os outros guias iam mantendo a fila. Foram mais de duas horas de passeio entre pinguins e algumas focas na praia, e para terminar, uma passageira deixou cair um binóculo dentro d'água. Resultado: Ben, nosso piloto de bote, caiu na água com uma roupa seca para "salvar"o bendito binóculo. Pelo menos foi divertido.



Ben caindo na água e eu, feliz da vida, aproveitando o sol de Mikkelsen.

Subimos a bordo o almoço (delicioso, como sempre) e seguimos um pouco mais para o lado da Península, para o segundo programa do dia - um cruzeiro de bote (Zodiac) pela baia de Cierva Cove, ao lado de uma base argentina abandonada chamada "Primavera". É impressionante a quantidade de bases e refúgios argentinos completamente abandonados por aqui.



Pilotando o "Zodiac" e uma vista gelada de Cierva Cove.

O que eu mais gosto de fazer nessas viagens é exatamente isso: pilotar um bote. É com certeza a parte mais gostosa, onde me sinto mais livre por aqui. Passamos por vários icebergs, muito gelo picado boiando, algumas focas descansando e uma pinguineira gigantesca próximo da base, onde encontramos um grupo alegre de pinguins jovens nadando.



Pinguins nadando em Cierva Cove.

Desembarquei meus passageiros rapidamente na ilha e fiquei a deriva com o bote, esperando que o grupo tirasse fotos da base abandonada e arredores. Aproveitei para correr um pouco com o bote e ainda resgatar um pedaço pesado de gelo transparente para usarmos no bar a noite. O pedaço pesava uns 60 kilos e não foi fácil tirá-lo da água, mas afinal consegui. Voltei para a base e embarquei meus passageiros, com direito ainda a fotos por um iceberg azul que estava por ali.

O descanço a noite foi merecido: boa janta (filé de Merluza), um pouco de conversa e chocolate quente depois, no Panorama Lounge, enquanto o navio começava seu caminho para a entrada do Canal de Neumeyer. Infelizmente o tempo virou um pouco. Dá para ver pelas fotos que começou a ficar cinza no fim da tarde e agora cruzamos lentamente as águas do estreito de Gerlache até a entrada do canal de Neumeyer, com uma neve fina caindo, um nevoeiro leve, e um vento frio vindo de nordeste. Cruzamos com alguns barcos no caminho (Akademik Ioffe e Prince Albert I), mas sem muito papo furado no rádio. A meia noite todos já estavam em suas cabines, aguardando como seria o dia de amanhã.

16/12 - Dorian Bay & Port Charcot

Variações de humor são normais em qualquer situação de confinamento. Aqui não é diferente. Acordei meio de mau humor. O tempo estava fechado, gelado e ventoso (40 nós de vento ~ 80 km/h) e o café da manhã foi com um briefing meio pesado. Acho que era cansaço de todos. A previsão era de diminuição do vento por volta das 9h e foi exatamente o que aconteceu. Desembarcamos na praia de Amyr Klink (Dorian Bay) por volta das 9h30, eu e Daniel na frente para abrir caminho no meio da neve e verificar se tudo estava bem por ali. Dorian é o único lugar do planeta onde se pode ver uma base argentina e outra inglesa lado a lado (mesmo que desativadas !).



Refúgio inglês restaurado em Dorian, e eu com a "mardita" pá de cavar neve.

Ficamos por ali até as 11h30. Minha tarefa final foi fechar a fila, garantindo que nada tinha sido deixado para trás, e tapando os buracos que deixamos na neve com as nossas pegadas (suei a camisa mesmo !). Dorian é um lugar muito legal, mas sinceramente, ainda prefiro o outro lado da de Domey Point - Port Lockeroy. Mas infelizmente lá estava ocupado com outro navio. Vai ficar para outra vez. O almoço foi rápido pois as 13hs iriamos entrar no Canal de Lemaire - um canal estreito e muito bonito que marca a passagem para as Ilhas Argentinas, com Port Charcot de um lado e o arquipélago de Plennaeu.



Mapa da área com a posição de Dorian Bay e de Port Charcot.

O canal estava cheio de gelo mas mesmo assim decidimos tentar a passagem. Os passageiros se apinharam no deck superior para tirar as melhores fotos da tentativa de passar no meio de tanto gelo. Mas foi impossivel. Em um momento, não havia mais espaço para o navio e tivemos que recuar.



O plano original neste dia era desembarcar na Ilha Petermann, ao final do canal de Lemaire. Mas tivemos que mudar os planos e decidimos fazer um tour com os botes em Port Charcot, uma baia rasa cheia de icebergs, focas, pinguins e placas de gelo. Foi um passeio maravilhoso ! a coisa que eu mais gosto é pilotar um zodiac. Esses botes são fantasticamente flexiveis e rápidos. E o tempo estava tão fantástico que até fizemos uma pequena loucura: subimos em uma placa de gelo, com passageiros e tudo ! Essa placa tinha não mais que 30 cm de espessura e aguentava facilmente o peso do bote e de todos. Foto memorável !



Ficamos na água até as 18hs, quando então subimos rapidamente para o barco, para um curto debriefing e uma surpresa gastronômica: churrasco antártico (se bem que não dá para chamar a comida dos gringos de churrasco - hehe). Mas foi divertido. Comida, música e conversa no deck superior, aproveitando o clima agradável à zero graus de temperatura, e nada de vento.



A noite acabou para mim, cansado mas bem, no pôr do sol - que não dá para chamar bem de pôr de sol. Afinal, são 11 da noite e o sol ainda brilha no horizonte. Muito em breve não teremos mais noite de forma alguma.



Buenas Noches. Good night. Guten Nahct - Port Charcot.

17/12 - Paradise Bay & Cuverville Island

O dia no paraíso começou cedo. Senti que o barco começou a se movimentar por volta das 2h da manhã mas eu não sai da cama. Afiinal tinha que descansar. Logo de manhã cedo acordei com o chamado de Mariano para o briefing dos guias e como iriamos coordenar a saída matinal. As 9hs saímos com 6 botes na água na sequência combinada: 2 botes francêses, 2 botes de lingua inglesa (eu pilotando o No. 2), e mais dois botes de lingua espanhola. Passamos navegando pela baía paraíso (Paradise Bay) com os botes e rodeando o glacier de Skontorp - um lugar belíssimo. Embora eu ainda esteja meio de mau humor, pelo menos o passeio de bote foi tranquilo.


Pilotando o bote em Skontorp (com um chapéu para atrair focas leopardo!)


Panorama da Base Almirante Brown.

Logo na sequência fizemos um desembarque na base Almirante Brown (Argentina) que estava vazia, apesar da bandeira argentina meio rasgada que tremulava no mastro. Ali tiramos a foto do grupo e depois ainda fizemos uma breve caminhada pela estação. Na verdade foi tudo muito rápido pois eu tinha que voltar correndo para me preparar para uma palestra sobre Mudanças Climáticas as 11:45 hs no lounge panorâmico. Como sempre a palestra foi concorrida e muito discutida. O tema é controverso e sempre há discussão sobre pontos de vista diferentes.

Após o almoço, combinamos o desembarque em Cuverville e enquanto eu estava trabalhando um pouco no computador, ouvi Sebástian, nosso amigo argentino de Ushuaia, chamar no rádio. Ele estava a bordo de outro barco de turismo passando pelo canal afora. Naquele momento era impossível falar com ele, então combinamos de talvez amanhã, em Decpection, fazermos um contato por rádio.


Breve descanço na praia em Cuverville junto com os pinguins.

A tarde seguimos para o norte e fizemos um desembarque em Cuverville, uma ilha cheia de pinguins e skuas, com neve até o pescoço. O dia estava magnífico e as pessoas parece que queriam só ficar olhando os pinguíns. Então não tive muito trabalho e pude observar mais de perto algumas peculiaridades do local. No ano passado havia bastante neve também, mas um pouco mais densa do que agora. Este ano a neve está muito fofa, o que significa que foi depositada como uma forte nevasca (precipitação intensa). Aparentemente, as encostas da baia onde se encontra Cuverville estão com pouca neve. Será que é efeito de aquecimento do ar ? ou um verão mais cedo ? Tirei algumas medidas de salinidade ao redor da baia onde estávamos e tudo estava normal. A salinidade estava um pouco baixa mas nada anormal para esta época.

Por volta das 17h30 voltamos para o barco e logo no retorno, deu tempo apenas de tomar um banho e correr para a biblioteca, já que eu deveria ministrar a palestra da manhã, só que desta vez em espanhol. Um casal muito simpático foi minha única platéia e como prêmio, a janta foi atum grelhado. Logo em seguida fui trabalhar no escritório em cima do programa do dia seguinte, caindo na cama por volta das 23horas depois de arrumar meu quarto que estava uma bagunça só.

18/12 - Deception e Livingston

O dia começou cedo hoje - 5hs com um despertar forte de Mariano. Estávamos em deception e iriamos tentar logo cedo um desembarque em Baily`s head, um ponto magnífico com uma encosta super íngrime, de dificílimo acesso, e com mais de meio milhão de pinguins "Chinstrap". Mariano me pediu para vestir um sapão (Wader) a prova d'água de forma a ter alguém para controlar os botes na praia. Como o swell é muito forte, temos que lançar os botes na areia com velocidade, e alguém tem que entrar na água para segurá-los depois disso. Foi exatamente o que eu fiz. O único problema é que eu esqueci de colocar "liners" dentro do sapão - uma camada grossa protetora que aquece os pés. Resultado - fiquei completamente gelado, apesar de seco. Mas depois consegui me recuperar. A visita a Bailys foi um ponto alto da viagem pois a quantidade de pinguins realmente impressiona.


Praia em Baily Head forrada de pinguins Chinstrap (Barbicha).

Voltamos a bordo logo em seguida para um café da manhã bem quente, e desembarque as 9hs em Whalers Bay, dentro da ilha Deception. O tempo estava bastante encoberto mas mesmo assim conseguimos um bom desembarque, com muita gente interessada na história local. Whalers é uma praia meio triste pois ali morreram muitas e muitas baleias na época dos baleeiros antárticos. Além de visitar as ruinas locais, ainda subimos em um local mágico: "as janelas de Neptuno", bem na parede vulcânica da ilha. Um penhasco íngrime com algumas dezenas de metros de altura e cheio de pássaros. Fantástico. Na volta, alguns corajosos passageiros ainda entraram na água, que apesar da maré baixa e das fontes termais da ilha, ainda estava um pouco fria para o meu gosto.


Corajosos passageiros tomando banho nas águas geladas junto com os pinguins.

Voltamos para bordo a tempo de desfrutar um excelente almoço e seguir para Hannah Point - na ilha Livingston. O local é repleto de fósseis e uma infinidade de rochas dos mais variados tipos, além é claro, da população local de Elefantes Marinhos e petréis gigantes. Não foi uma caminhada fácil pois tinhamos que desviar de vários pontos de segurança (distância mínima dos animais), bem como não pisar nas mais variadas gramíneas que ali existem. Mas conseguimos. Na volta encontrei a praia repleta de krill. Sinal de que as coisas iam bem por ali pelo menos em termos de alimento para os pinguíns e baleias.


Elefante marinho descansando em Hannah Point e um krill perdido na praia.

Mas o dia não tinha terminado pois havia ainda a janta, o concurso fotográfico antártico, que fazemos ao final de cada viagem, e ainda toda a programação de amanhã. O problema é que havia a noticia de que talvez o vôo não saísse de Punta Arenas como planejado. Se isso ocorrer, vamos ter que fazer um plano B. Por isso mesmo, estou indo dormir - mais cansado que qualquer outra coisa.

19/12 - Parados em Frei

Acordei agora a pouco (5h30) com o navio em aproximação a baia Maxwell, onde fica a base chilena Eduardo Frei. O tempo está fechado e provavelmente não teremos vôo hoje. Como ainda é muito cedo, provavelmente o povo vai acordar só as 8h para o café e daí veremos o que vamos fazer. Vou manter todos informados. Agora é hora de colocar a comunicação em dia.

Um comentário:

  1. Andre,
    Muito bom seu diaário, é fantastica essa viagem e estão todos de parabéns.
    Obrigado por nos trazer esses relatos que nos remetem a um lugar que poucos conhecerão.
    Abraços, Ailis

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