03/01 - troca de grupo
O dia amanheceu com o céu meio incoberto, mas com algumas aberturas azul longe dentro da baia Fields. Entramos no ponto de fundeio na hora programada, no meio do café da manhã. Eu estava cedo no Lounge tentando uma conexão estável de internet e em pouco tempo atualizei as fotos e o blog, falei com a minha mãe e depois fui cuidar das tarefas diárias de bordo. As 10hs fui para Ardley Island com um grupo para ver o estado dos pinguins e caminhar pela praia. Mariano ficou a bordo organizando o translado de passageiros pois naquele dia chegaria mais um vôo. O passeio foi tranquilo, e soubemos que o avião estava a caminho e que provavelmente iriamos transportar os passageiros diretamente da ilha Ardley para a praia em Frei, onde pegariam o avião. Foram dois grupos de 20 e tantos passageiros, com uma hora e meia de passeio. Por volta das 12hs tomamos um susto: o "imbecil" (o termo é este mesmo !) do piloto do avião jato da DAP, a empresa que faz os vôos para a Antártica, passou sobrevoando a ilha em um vôo muito baixo fazendo um caos entre os pinguins da ilha com o barulho das turbinas. A noite fiz um relatório que vai ser enviado para a empresa pois sei que os aviões não tem permissão de sobrevôo (droga!). Vi vários pinguins correndo assustados e alguns filhotes caindo dos ninhos. Fiquei revoltadíssimo !
Ardley Islando (e eu ainda sorrindo antes do avião estragar tudo), e o avião na pista com os passageiros novos.
Saímos com todos os passageiros para Frei, juntando o grupo, e rapidamente Miguel e eu subimos até a pista para receber os passageiros novos que estavam chegando. Afinal, descobri que o avião que fez o sobrevôo na ilha era outro vôo, para um outro grupo, mas mesmo assim entreguei o relatório a noite para os responsáveis da empresa. Descemos com o grupo novo (com dois brasileiros neste!) e fomos direto para o navio. Fiz duas corridas de bote entre a praia e o navio, e corri para o banho, para me preparar para o Safety Briefing a bordo. O grupo era grande - 64 passageiros, e zarpamos rápido para a península, para aproveitarmos o tempo bom. Infelizmente o doutor (Sérgio) foi embora com o grupo e chegou um novo doutor (Alvaro) que ficou impressionado com o fato de eu estar cuidando do dedo fraturado de maneira tão simples (hehe na verdade ele ficou meio consternado porque achou que era mais grave), mas o dedo está muito bem, não está doendo tanto, e tudo vai bem (obrigado!) embora ele me chame de maluco várias vezes.
Depois da janta subimos ao Lounge para batepapo geral e aos poucos os passageiros foram desaparecendo para suas cabines. Fiquei um pouco saudoso de casa pois uma das passageiras se chama Sophie e tem 7 anos, a mesma idade da Mariana. Uma graça. Fui dormir as 23hs, cansado mas bem tranquilo. Afinal, começava mais uma expedição, a de número 5 nesta temporada.
04/01 - Mikkelsen (de novo!) e Cierva Cova
Acordei com o balanço gostoso do barco em uma curva suave, provavelmente quando trocava de rumo ao redor da Ilha Trinity. Olhei no relógio e eram 6h30. Faltava pouco para o "wakeup call" de Mariano as 7hs e eu estava ainda meio sonolento. Na verdade quem me fez levantar foi meu estômago, rocando de fome. Tomamos café já fundeados na baia de Mikkelsen, com um tempo feio, cinza, nebuloso mas pelo menos sem ondas e sem vento. Baixamos na Ilha Mikkelsen as 9hs com 3 botes e um pouco de chuva, e desta vez fomos nos organizando em grupos e avançando pelo interior da ilha. Me surpreendi muito com a ausência (ainda) de filhotes, o que reforçava a teoria que estava bolando com Miguel, que a precipitação excessiva neste verão e as temperaturas mais altas desta parte da península provavelmente afetaram o modo de alimentaçäo dos pinguins por aqui. Com menos comida, demoram mais para chocar os ovos. No topo da ilha vimos apenas um ninho com filhote (de 2 dias no máximo), e as skuas estavam também bem famintas. Vimos vários ataques e roubos de ovos em apenas 2 horas na ilha. Haviam também algumas focas na praia e a neve tinha derretido ao ponto de podermos ver a estrutura de uma velha baleeira soterrada. Ainda tive tempo de brincar um pouco com a Sophie na praia. Ela adora pinguins, como a Mariana, e prometi colocar as duas em contato quando voltasse para o Brasil.
Mikkelsen com um tempinho horroroso.
Saimos de lá por volta das 11hs e seguimos durante o almoço para Cierva Cove, onde estávamos programados para um tour de Zodiac pela baia. Dividimos os grupos, coloquei meu gorro de pinguim para dar sorte e partimos (Alex e eu - dois botes) para dentro da baia, onde eu sabia que poderiamos ver algo de interessante. Não deu outra. A foca leopardo que vimos outro dia por ali estava ainda deitada sobre o mesmo bloco de gelo, dormindo. Ela devia estar dormindo a uns 3-4 dias, como de costume destes animais. Ainda seguimos adiante para a "baia das Skuas", um lugar protegido no fundo da geleira onde várias skuas tem o costume de sobrevoar os botes. Voltamos depois de duas horas de passeio, com os passageiros meio congelados mas alegres, afinal vimos mais uma foca leopardo em outro bloco de gelo.
Foca leopardo dormindo tranquilamente em um bloco de gelo em Cierva.
O dia foi tranquilo e de relax, e terminou de forma grandiosa. O alerta de baleias chegou bem no final da janta. Várias jubartes na área e algumas saltando completamente fora d'água. Fantástico ! Hoje devo dormir cedo pois amanhã estaremos mais ao sul da península, e quem sabe, tentando entrar de novo no canal de Lemaire.
05/01 - Verdnasky, Peterman island and Barbecue
Rotina diária: despertar, café da manhã e Briefing. Estávamos ancorados na frente de Verdnasky, a base ucraniana nas Ilhas Argentinas, ao sul do Estreito de Lemaire, que atravessamos em meio a um nevoeiro cerradíssimo. A idéia era baixar os passageiros em dois grupos: o primeiro iria para Wordy`s House, uma construção inglesa recém restaurada no meio de umas das ilhas, e o segundo para a base ucraniana. Eu fiquei com o segundo grupo, organizando o pessoal em terra e coletando os passaportes de todo mundo para carimbos. Mesmo com todo o trabalho ainda deu tempo de visitar o "bar mais ao sul do planeta", onde se toma vodka feita na estação por 3 US$ ou, se for mulher, é só deixar o sutiã na "coleção de sutiãs da estação" (haha). Parece piada mas não é, e a idéia do bar é no mínimo curiosa: Verdnasky na verdade era uma base inglesa, abandonada na metade do século passado e que foi vendida para os ucranianos por 1 libra (que inclusive está fincada na madeira do bar). O bar foi construido por dois carpinteiros ingleses que deveriam ter construido um telhado durante um dos invernos na estação, mas como o tempo estava feio e o inverno rigoroso, decidiram ficar dentro da estação e fizeram um excelente trabalho construindo um pub inglês. A tradição dos ucranianos então se estabeleceu, de que homens pagam pela vodka, mas as mulheres, se deixarem o sutiã, levam de graça. Uma comédia.
A entrada de Verdnasky e Miguel e eu no bar (veja a coleção de Sutiãs atrás da gente!).
Saímos de Verdnasky um pouco antes do almoço e durante a comida movimentamos o navio um pouco mais para o norte, para a ilha Peterman, a colônia mais ao sul de pinguins gentoos (que não acredito muito!). Ficamos por ali umas duas horas e meia. Foi bem trabalhoso pois a ilha é grande e havia passageiros para todos os lados, mesmo com o caminho delimitado por bandeiras. Que sufoco.
Voltamos para bordo e movimentamos o navio mais uma vez, para a baia Plenneau, ao final do canal de Lemaire. Ali descemos mais uma vez os botes e saímos por uma hora para explorar o cemitério de icebergs. A posição das ilhas favorece a entrada de icebergs que acabam encalhando por ali até degelar. Eu segui com o meu grupo para dentro do cemitério, contornando a ilha até chegarmos a Port Charcot, onde o capitão frances (Charcot, obviamente) invernou pela primeira vez com o barco "Le France". Ficamos rodando por ali por uma hora até voltarmos a bordo para a janta surpresa - churrasco ! regado a cerveja e música. Diz a lenda deste churrasco que Mariano comeu 14 pedaços de costela ! Eu comi uns 4 steaks e perdi a conta das linguiças a moda germânica. Fiquei conversando com Luiz Fernando e Maria Flávia, os brazucas que vieraram ver o branco antártico. Ainda teve um pouco de festa no Lounge com dança e tudo mais, mas o cansaço me venceu e fui dormir de barriga cheia.
Os 3 patetas: André, Alex e Miguel e uma foto de Sophie no churrasco Antártico.
06/01 - Baía Paraiso e Neko Harbour
"São 7h e o dia está maravilhoso lá fora". Foi assim que acordei, com o chamado de Mariano no sistema de som. Embora estivesse com sono, acordei um pouco mais animado porque pela manhã iriamos fazer um cruzeiro de zodiac e eu adorava isso ! 9h em ponto saímos. Peguei um bote com o motor bem forte, uma familia de americanos, um casal holandês e um casal brasileiro (eh que legal !). Rodamos pela baia por cerca de uma hora, entre pedaços de gelo e um céu meio coberto e meio azul. Algumas focas dormiam em uma pequena praia entre as geleiras, e seguimos assim bem tranquilos. O plano era voltar para perto do barco e desembarcar na base argentina de Brown por volta das 10h30, que fica na beirada da geleira Skontorp. De longe, vimos um movimento na base da geleira, de pássaros voando ao redor de um bloco de gelo, e decidimos das uma olhada antes de seguir com os planos de desembarque. Havia uma foca na água e preparei minha câmera para fazer um filme um pouco mais perto dela. Ficamos por uns minutos perto da base da geleira, cerca de 300 m dela, observando, quando de repente um pequeno pedaço despencou na água fazendo bastante barulho. Que legal ! foi o grito geral, mas dai, mais pedaços cairam e um bloco gigante se desprendeu da geleira. Como um arranha-céu, subiu flutuando livre da geleira, mais de 70 metros de altura, e o peso do gelo fez com que a estrutura inteira entrasse em colapso com um barulho enorme e uma onda de uns 3 metros de altura, um mini-tsunami. É óbvio que nessa hora eu estava apontando o nariz para fora da baia, e quando vi o tamanho da onda, dei gás no motor e saímos a jato fora do alcance das ondas. Eu consegui manobrar o bote enquanto filmava o bloco imenso de gelo se desintegrando na água. Que coisa mais incrível ! Depois da adrenalina inicial, o delírio foi geral. Que sorte que estávamos no lugar certo e na distância certa.
Paradise Bay com o Ocean Nova ao fundo.
Seguimos ainda meio bêbados de alegria para a base Brown, onde subimos na pequena montanha de neve atrás da estação para depois descer em um famoso "ski-bunda", ou seja, escorregando pela neve. Voltamos logo em seguida para o navio, para o almoço, com os argentinos da base como convidados, e zarpamos as 13hs para Neko Harbour. O dia estava claro, céu azul, sem vento e temperatura altíssima, na marca dos 5 graus ! Na praia, logo no desembarque, já tirei o casaco e andei pelo caminho até a pinguineira só de camiseta - que calor ! os pinguins estavam todos de bico aberto e lingua de fora, posição que normalmente fazem quando está quente. Os passageiros, em sua maioria, subiram para o alto do morro e eu fiquei no meio do caminho para controlar o fluxo e também porque queria ficar observando a geleira de Neko, que é bastante ativa. Consegui filmar mais dois desprendimentos de gelo, que varreram a praia com uma onda de um metro. Desci para a praia com alguns passageiros, aguardando os botes de transporte, e aproveitei o momento para filmar uns pinguins dentro d'água. Um barato !
Calor em Neko. De camiseta perto da pinguineira.
Voltamos para o navio as 18h, já em ritmo de banho: "Polar Plunge". Corajosos e destemidos passageiros saltaram nas águas geladas de Neko. Até a Sofia, uma menina de 7 anos que dirige zodiac muito bem, pulou na água gelada !
Jantar dado, banho tomado, agora é hora de dormir porque amanhã temos Deception !
07/01 - Deception e Hannah Point
Lá pelas tantas da madrugada acordei batendo a cabeça no armário que fica do lado da cama. O barco estava rolando bastante e parece que brigava unm pouco com as ondas. Olhei no relógio e eram 5h30 da manhã. Deviamos estar a umas 15 milhas de Deception mas nem me preocupei muito pois podia ficar na cama um pouco mais. O despertar veio pontualmente as 7hs com as informações de Mariano sobre o tempo ensolarado mas com muito vento, e a entrada eminente pelos Foles de Neptuno, na Ilha Deception. Tomei café rápido e fui a ponte de comando para ver a situação: ventos de 25 nós (50 km/h) e um sol forte, entre poucas nuvens. Nem sinal de vapor na praia, resultado de fumarolas e água quente que flui da terra em direção a praia. Dividimos os passageiros em dois grupos. O primeiro e maior grupo, fez uma caminhada de uma hora mais ou menos, subindo a borda da cratera externa e com uma visão previlegiada da ilha. O segundo e menor grupo ficou comigo e com Adrian, para explorarmos as ruinas da ilha.
Baleeira de transporte em Deception (com quase 100 anos de idade).
Apesar do vento forte, conseguimos fazer um tour bem interessante e demorado por todas as ruinas. Lá pelas tantas captamos o sinal de rádio do pessoal que subiu a cratera e me parece que o vento estava bem forte por lá. Sorte nossa que ficamos aqui embaixo. Em duas horas já estávamos prontos para voltar ao barco e saborear um delicioso almoço. Logo depois da comida, dei minha palestra sobre trocas climáticas globais enquanto seguiamos para Hannah Point, ao sul da ilha Livingston.
Elefante marinho em Hannah Point.
O mar não estava para peixe: swell de mais de 3 metros e uma dificuldade enorme de desembarcar na praia. Mariano me pediu para colocar o "sapão", o impermeável para ajudar os passageiros a descer na praia, que por sinal estava lotada de elefantes marinhos, barulhentos e fedorentos. Complicado ! O grupo ficou meio disperso no início e tive que gritar com alguns para colocar ordem na casa. Aos poucos fomos entrando nos eixos, e as coisas foram ficando dentro dos parâmetros de controle. Eu estava meio irritado pois além da bagunça, meu sapão tinha um furo e me deixou "meio" molhado. Foram umas duas horas de tour pela praia com elefantes por todos os lados. Na volta ainda pegamos um mar bravo mas deu para controlar o barco e a molhadeira antes de entrar no navio. Tomei uma ducha quente e fui correndo para o Panorama Lounge para a apresentação final. Este grupo irá embora amanhã e outro entra em cena. Logo depois da janta tivemos uma confratenização a bordo e enquanto batia papo, trabalhava na cópia de dados em pendrive que os passageiros recebem, bem como organizava os documentos para a troca de passageiros no dia seguinte - trabalheira !!!
Agora são quase meia noite e estamos chegando em Fields. Irei apenas baixar esse post do blog e vou dormir. Amanhã quero estar pronto para o trabalho logo cedo. O dia vai ser cheio.
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Atualização: 08/12 - Ficamos de manhã no navio, com palestras e filmes, esperando por notícias. O avião chegou as 14 hs e a transferência foi rápida. Fiquei o dia todo operando bote, ajudando nas bagagens e controlando a papelada normal de dia de transferência. Voltamos ao barco as 16 horas com um grupo novo de passageiros, das mais variadas nacionalidades. Tive tempo apenas para um banho rápido pois as 17 horas já iniciamos o Briefing de segurança. Agora vamos levantar âncora para mais uma viagem rumo a península, a Classica Antarctica 06. Até o dia 13/01 !
Não acredito que vc viu um monte de Jubarte saltando e não tem uma foto!!rsrsrsr
ResponderExcluirbjs Le
It's fun seeing the photos of the December trip and doing a "Google translation" to figure out what you write in your blog! I miss Antarctica and the wonderful crew!
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